Crystal - Filha da guerra

Decorria o ano de 1937.
Numa quinta no meio do Texas vive uma jovem menina, uma menina que apesar da sua tenra idade trabalha, ajuda o pai nos campos, a mãe na cozinha, os tios com o gado, e pelo meio ainda arranja tempo para ir á escola.
É uma família pobre, trabalhadora, insiste para que a filha vá á escola para que tenha um futuro melhor, possa ter dinheiro para fazer escolhas na vida, coisa que eles próprios não puderam fazer.
Tal como ela tinham começado a trabalhar prematuramente, era natural naquela altura começar-se a trabalhar aos 10 anos e não mais parar até deixar de respirar.
Mas para Crystal seria diferente, estudaria até aos pais conseguirem pagar, tencionavam que ela fosse para a grande cidade e tivesse estudos, queriam que fosse respeitada.
Mas era ali no meio dos montes, no meio do gado que Crystal era feliz, era uma menina tímida, preferia estar sozinha com o seu cavalo do que com alguém, não tinha contacto com meninos da sua idade, só na escola, mas mesmo aí não contactava muito com eles, chegava á escola ás 8h da manha, já com 2 horas de trabalho feito, saia ás 15 horas e voltava logo para a quinta, trabalhava até o sol se por, e muitas vezes até depois disso.
Naquele local não havia autocarros para ir buscar as crianças a casa, por isso o seu cavalo era o meio de transporte, o mais rápido também.
Crystal levantava-se frequentemente ás 5.30 da manha para puder ir nadar no lago da propriedade antes de ir trabalhar, saía de casa de mansinho, sem fazer barulho, ia ao estábulo buscar o seu cavalo negro, e cavalgava em pêlo, não gostava de lhe pôr a cela nem os estribos, achava incorrecto terem tanto peso em cima, assim era mais natural, era o seu peso e o de Crystal, nada mais.
O lago ficava a cerca de 10 minutos a cavalo, sempre que lá chegava Crystal afagava Stalion, o seu cavalo de 3 anos, um gesto de agradecimento por a ter trazido ali, ela não o via como um animal, era seu amigo, estava lá sempre para ela, e apesar de não falar, Crystal tinha a sensação que ele a percebia.
Deixava-o á solta, para que se alimentasse das ervas cobertas de orvalho, ele não ia longe, e se fosse bastava ela assobiar para que voltasse num instante.
Crystal adorava nadar naquele lago, ao natural, não estando ciente da sua beleza estonteante.
Ela nada dizia aos pais quanto a ir aquele sitio, sabia que não a deixariam ir, muito menos se soubessem que o fazia da maneira que o fazia.
Naquele tempo que ali passava sentia-se livre, do trabalho, da escola, das pessoas, de tudo, era só ela e os seus pensamentos.
Só se ouviam os pássaros com as suas cantorias matinais, parecia que estavam ali para a cumprimentar, para lhe dar as boas vindas aquele local, ás suas casas, afinal Crystal estava no seu território.
Ela adorava ficar a olhar para eles, imaginava-se a voar, de um lado para o outro, imaginava-se a cantar como eles.
Depois de 30 minutos a nadar, decidiu que já chegava, queria chegar a casa antes que os pais acordassem.
Tinha de trabalhar de qualquer das maneiras, olhou em volta mas Stalion não estava, assobiou e este veio logo a correr.
Fez o caminho até casa a passo, não tinha pressa, queria aproveitar o seu tempo sozinha.
Foi por o cavalo no estábulo, deu-lhe feno, e foi para casa, ja ali iria para cuidar dele e de todos os outros.
Quando finalmente chegou a casa, os pais estavam a levantar-se, mas não deram por ela ter saído, acharam que se tinha levantado mais cedo para tomar o pequeno almoço.
Crystal fez o pequeno almoço para todos, preparou ovos e bacon, o costume numa região daquelas, almoçavam tarde, por volta das 14h depois de metade do trabalho estar feito, paravam por 10 minutos, comiam umas sandes e fruta, também por ela preparada.
O pai ia para os campos, tratar das plantações, tinha pomares de macieiras, laranjas e pêssegos, uma estufa com morangos, tinham abóboras, batatas, melões, que vendiam em feiras especificas, e depois um pequeno quintal para uso próprio com couves, alface, tomate, salsa, coentros e tudo o que precisavam, mas tudo em pequenas quantidades, só o essencial.
A mãe ficava a arrumar a cozinha, ela fazia bolos e salgados para vender aos vizinhos.
Os tios criavam gado, tinham cerca de 2000 cabeças de gado bovino, 1000 ovelhas e criavam cavalos de corrida.
Ela tinha ficado encarregue de criar de 5 cavalos, 2 garanhões e 3 fêmeas, estavam á sua responsabilidade, Stalion, que ela tinha implorado para ficar, só ficou se ela aceitasse ficar encarregue dos outros, o pai não tinha tempo para cuidar deles, por isso iria vendê-los, mas Crystal ficara com eles.
Tirando o trabalho árduo e a ida á escola que ela detestava, a sua vida era relativamente feliz, ia ao lago de manhã e á noite sentava-se no alpendre a ver as estrelas.
Mas tudo estava prestes a mudar.
Na sexta feira 13, do mês de Outubro, por volta das 6 da manha, quando Crystal regressava do seu habitual passeio matinal, estava uma manhã fresca e queria sentir o ar na sua cara, por isso decidiu vir em corrida no seu cavalo. Estavam quase a chegar ao estábulo quando uma cobra se atravessa no seu caminho e o cavalo empinou, derrubando Crystal.
Foi uma queda bastante aparatosa e ainda por cima não havia ninguém por perto para a ajudar, Stalion apercebeu-se que Crystal estava magoada e ficou junto desta, fazendo barulho para chamar a atenção.
Passados 30 minutos o seu pau passava por ali, para ir para os campos e viu-a estendida no chão.
"Crystal... Crystal... estás bem? Que se passou?" Jack estava em choque ao ver ali a sua filha estendida no chão.
"Ai, doí-me as costas."- falou a custo
"Claro que sim, caíste do cavalo não foi? Animal estúpido"
"Não, não é estúpido,uma cobra atravessou-se á nossa frente e ele assustou-se, não tem culpa nenhuma."
"Mas mesmo assim, que raio."
Levantou-se e foi buscar o tractor, iria levá-la a casa para que de lá ligassem para o hospital.
Com cuidado levantou-a do chão e meteu-a suavemente no atrelado, mas esta não deixou de se queixar, tinha provavelmente ossos partidos.
Foi devagar para que Crystal não sentisse os ressaltos da estrada de terra batida.
Crystal gemia no atrelado, estava muito magoada.
Chegaram a casa em 10 minutos, quando la chegaram Jack gritou para que Sally, a sua mulher ligasse para o hospital, para que a viessem buscar.
Sally entrara em choque, mas consegui ligar.
Enquanto os médicos não vinham Jack envolveu Crystal numa ligadura ,a zona das costelas, de certeza que tinha partido algumas.
Os paramédicos demoraram e quando chegaram não se safaram a ouvir os gritos dos pais de Crystal.
Foi levada na ambulância, não era muito mais confortável que o tractor mas era o que havia na altura, eram ambulâncias militares, estavam ao serviço do exército americano, e estava equipada com medicamentos para primeiros socorros.
Sally e Jack foram logo atrás deles, na pick up de trabalho, as estradas eram de terra durante alguns quilómetros, desde Joshua, o lugar onde viviam, até chegarem á estrada 35 que atravessa todo o estado do Texas, desde da fronteira com o México até Oklahoma.
Quando lá chegaram aceleraram, Crystal estava a perder as forças, já mal conseguia abrir os olhos, os paramédicos estavam a fazer de tudo para que ela ficasse bem, mas dali, nada mais podiam fazer.
Finalmente chegaram ao hospital, Crystal foi para os cuidados intensivos, Jack e Sally tiveram que ficar cá fora á espera. Passaram 2 horas e nem uma noticia de Crystal.
A mãe chorava, o pai andava de um lado para o outro, e sempre que passava uma enfermeira ou algum médico ele perguntava pela filha.
Começavam a temer o pior quando finalmente o médico veio ter com eles.
“A sua filha está bem, tem 3 costelas partidas, um pulso partido, mas de resto está tudo bem, teve sorte em não perfurar um pulmão.”
“Felizmente, ainda bem que são boas noticias, e quando a pudemos ver?”
“Só daqui a algumas horas, ela ainda está a recuperar da operação, mas assim que puderem eu chamo-vos, fiquem descansados.”
“Ok doutor, muito obrigado.”

Sentaram-se, desta vez mais calmos, mas ainda assim queriam vê-la, certificarem-se com os próprios olhos que Crystal estava bem.
Quando finalmente a puderam ver foram a correr ao seu encontro, Crystal estava num quarto pequeno e em mau estado, o hospital estava degradado, já era antigo e não havia verbas para o ir recuperando.
Crystal olhou para os pais e baixinho disse- “Desculpem.”
“Tas a pedir desculpa porque?”
“Por vos ter feito isto, sei que precisam de mim, e que precisam ir trabalhar, podem ir, eu arranjo maneira de voltar para casa.”
“Não sejas tonta, ninguém aqui vai a lado nenhum, só quando estiveres melhor.”
“Mas....” -ainda lhe custava a responder, devido ás dores nas costelas-“Vocês precisam trabalhar, a quinta não se gere a si própria.”
“Não te preocupes com isso agora, preocupa-te a ficar boa, ta bem?”
“Ok, vo tentar, como está o Stalion, arrumaram-no e tem-lhe dado comer?”
“Ainda te preocupas com esse animal.”
“Claro que sim e não fez por mal, assustou-se, e pelo que me apercebi ele ficou ao meu lado quando caí, não fugiu.”
“Mesmo assim, esse estúpido animal devia era estar preso.”
“Pai!!!” -gritou o mais alto que pode, encolhendo-se em seguida com as dores-“ Já te disse para o deixares em paz, ele é meu amigo, e é muito importante para mim.”
“Juro que não entendo o que vês nele.”
“ Fui eu que cuidei dele desde pequeno, apeguei-me muito a ele, ficamos muito amigos.”
“Ok, não se fala mais nisso, precisas de te concentrar em ti e na tua cura, queremos-te em casa o mais rapidamente possível, a tua mãe trata de ti”
“Vou tentar.”

Crystal ficou 2 dias no hospital para que recuperásse, mas o médico aconselhou-a a não trabalhar nos próximos dias, para que não abrisse os pontos.
Mal chegou a casa, Crystal foi logo ver Stalion, ele estava magrinho, tinha comida mas parecia que não lhe tinha tocado, assim que viu Crystal veio logo á porta do estábulo, cheirou-a.
Crystal ficou a acariciar-lhe o focinho por uns momentos, decidiu entrar, pegou numa escova e penteou-o.
Stalion começou logo a comer, comeu o feno com satisfação, parecia que tinha estado á espera de Crystal, e ela apreciou o gesto, ficou grata por saber que ele sentia a falta dela tanto como ela dele.
Depois de estar um bocado com Stalion e garantir que não precisava de comida ou água, foi para casa, estava cansada, as costelas voltaram a doer, e decidiu que por hoje já chegava.
Quando chegou a casa os pais já dormiam, Crystal foi sorrateiramente para o quarto.
Dormiu até as 10h da manha do dia seguinte, não estava habituada a dormir tanto, devia ser um efeito dos medicamentos, e como não ia trabalhar ninguém a acordou.
Desceu á cozinha, a mãe estava a cozinhar, Crystal foi ao frigorífico buscar um iogurte e foi para o alpendre.
Estava uma manhã confortável, não estava calor, mas também não estava frio, estava-se bem na rua, mesmo de camisa de dormir.
Pela primeira vez na sua vida, pela primeira vez em 12 anos, estava descansada, sem nada que fazer, sem ninguém a correr ao pé de si, era a primeira vez em 12 anos que se sentava no alpendre àquelas horas, só o conseguia fazer á noite, depois de um longo dia de trabalho.
Mas ali estava ela, sabia-lhe bem, mas por outro lado sentia que estava errado o que estava a fazer, não devia estar ali, mas sim nos campos, ou a cuidar do gado, a fazer qualquer coisas, mas não estava, estava ali sentada, sem fazer nada.
Não demorou muito a levantar-se, o iogurte desaparecera num instante, foi lavar a colher e arrumá-la na gaveta.
A mãe expulsou-a da cozinha, mandou-a ir para o quarto descansar, mas Crystal não queria, subiu para mudar de roupa, vestiu um lindo vestido florido, calçou umas sandálias e foi passear.
"Vais ter com algum rapaz Crystal?"- Gracejou a mãe ao vê-la assim vestida
"Não, claro que não, porque perguntas?"
"Sabes que não estou habituada a ver-te assim vestida, a não ser quando vamos para alguma festa ou quando vamos á igreja."
"Apeteceu-me, já que não posso trabalhar, não tem lógica vestir roupa para tal, e está a ficar calor, quero ficar confortável."
"Fazes bem, aproveita o dia, vê lá onde te metes, tem cuidado."
"Não te preocupes, não saio da propriedade, até logo."
"Até logo, porta-te bem"
"Tá bem." Saiu e dirigiu-se ao longo campo de flores em frente á casa.
Sally viu-a afastar-se, e aí apercebeu-se como ela estava crescida, estava a perder o crescimento da filha, estava a desperdiçar tempo precioso.
Crystal só foi vista, já o sol se tinha posto havia algumas horas, quando chegou estava com ar abatido e foi logo para o quarto.
"O que se passa Crystal" -Perguntou-lhe o pai,Jack, estava preocupado.
"Nada, preciso estar sozinha."
"Mas... de certeza que se passou alguma coisa para estares assim dessa maneira."
"Preciso descansar só isso"
"Não sei se acredito"
"Deixem-me!"-Gritou, era óbvio que algo a perturbara, e muito.
"Hei, não levantes o tom de voz minha menina, vamos la ver."
Crystal nada mais disse e dirigiu-se ao seu quarto, onde ficou até de manhã.

Quando Crystal desceu tinha ar de quem não tinha dormido, estava com umas enormes olheiras e arrastava-se ao andar.
"Que se passou ontem para vires naquele estado?"- perguntou-lhe a mãe.
"Nada, não quero falar no assunto ok, não insistas."
"Sabes que quero, alias queremos o melhor para ti, e acho que independentemente do que se tenha passado, deves um pedido de desculpas ao teu pai por lhe teres falado daquela maneira."
"Sim, eu sei, desculpa."
"Não é a mim que tens que pedir desculpa."
Crystal foi á procura do pai nos campos, mas não o encontrou.
Foi-lhe dito que ele tinha ido á cidade tratar de uns assuntos, Crystal achou estranho mas aceitou.
Vagueou sozinha pelos campos verdejantes, e debaixo do sol ardente do meio dia decidiu sentar-se debaixo do velho carvalho.
Ficou ali durante horas, envolta nos seus pensamentos, não via ninguém dali, só via os esquilos que se abrigavam, também eles do sol abrasador.
Ao longe ouviu alguém chamar por ela, levantou-se foi ao encontro da voz.
Era o seu pai, tinham-lhe dito que Crystal andava á sua procura, e decidiu ir ele á procura dela.
"Olá."
"Olá, que me querias á bocado?"
"Queria pedir-te desculpa pela maneira como te falei ontem."
"Não faz mal, mas não repitas a gracinha muitas vezes."
"Ok, desculpa"
"Queres falar no que se passou ontem?"
"Sim"
Sentaram-se á sombra do tractor.
"Diz la querida, o que se passou?"
"Ontem quando saí fui la ao estábulo, e .... " - Começou a chorar.
Jack abraçou-a- "Que se passou no estábulo querida?"- Estava preocupado.
"Eu.. eu... o Stalion desapareceu."
"Desapareceu?"- Estava agora mais confuso que preocupado- "Como assim desapareceu?"
"Não sei, abri-lhe a box e ele já la não estava, procurei por ele todo o dia, mas em vão, não está na propriedade."
"Estranho. Anda."
Meteram-se no tractor e foram de uma extremidade da quinta á outra e nenhum sinal do cavalo, nem de nenhuma vedação partida, ele não pode ter fugido sozinho, provavelmente teria sido roubado.
Jack questionou todos os empregados da quinta, e nenhum deles viu Stalion, nem nenhum desconhecido.
Dirigiram-se então ás quintas vizinhas, e uma vez mais ninguém sabia dele.
Crystal tinha ido ao lago no dia anterior ver se ele lá estava mas não havia sinal dele, tinha pura e simplesmente desaparecido.
Os dias seguintes, foram difíceis para todos, principalmente para Crystal, passava o dia á procura do Stalion e quando chegava a casa chorava por não ter novidades.

Uma semana depois do desaparecimento, Jack tinha combinado ir a uma feira de gado a alguns quilómetros dali, o irmão tinha gente interessada em alguns dos seus animais e queria aproveitar e vender o mais que podia.
Crystal foi contrariada, e ficou na carrinha o tempo todo, completamente alheia ao que se passava.
"Crystal chega aqui rápido"- Gritou o pai de longe, mas esta não ouviu.
"Crystal, não ouviste o que disse? Anda."
"Vou onde? Não quero, já te disse que não quero ir."
"Acho que desta vês queres ir, é melhor ires."
"Mas porque, o que se passa?"
"Anda, não te posso dizer mais nada"
Crystal saiu da carrinha e arrastou-se ao lado do pai.
Ao chegarem a uma vedação Crystal percebeu porque o pai tinha tanta urgência que ela lá fosse, ao longe via Stalion, estava ali á venda.
"Não podem, não podem vender o meu cavalo."
"Eu sei, por isso estou á espera do xerife, chamei-o cá para não armarmos confusão, sabes que somos conhecidos pelas quintas vizinhas, perderíamos a credibilidade toda, assim é melhor, só temos que garantir que ninguém se aproxima desta vedação"
"Boa, não deve ser difícil"
O que Crystal não sabia era o valor que Stalion valia, um garanhão daquela idade, com os genes que tinha era valiosíssimo.
A tarefa tornou-se quase impossível, até que por fim o xerife chegou e tomou conta dos acontecimentos.
Foi ter com o vendedor e colocou-lhe algumas perguntas.

"Bom dia, queria ver os documentos daquele exemplar ali."
"Bom dia, lamento mas não vai ser possível, este cavalo apareceu na minha quinta á uns dias atrás, cheio de fome, muito magrinho, tratei dele enquanto consegui, mas estasse a tornar caro e não tenho muito experiência no que toca a cavalos, por isso decidi vende-lo."
"Pois mas sabe que neste estado e em praticamente todos tem de ter os documentos do animal para o vender."
"Pois, como lhe disse não tenho muita experiência no que toca a cavalos e não sabia desse pormenor."
"Tudo bem, o que se passa é que tenho aqui os documentos dele, e os donos do cavalo estão ali."
"Á sim, por mim tudo bem, podem ficar com ele, como disse não tenho interesse em criar cavalos."
"É muito gentil da sua parte ceder assim, por essa acção vou deixar passar o facto de ter tentado vendê-lo sem documentos."
Crystal foi ter com Stalion, assim que este a viu foi a correr ter com ela.
Crystal só achava estranho ele ter desaparecido sozinho, era estranho se ele gostava assim dela porque teria fugido.
Jack tinha pedido ao irmão para este ir á quinta buscar o atrelado para que o pudesse levar até á quinta.
Jack levou Stalion e Crystal até a quinta, Crystal tinha de novo o brilho nos olhos, estava de novo completa.

Jack voltou á feira de gado para ajudar o irmão nas vendas, conseguiram vender todos os exemplares que levaram, cerca de 40 cabeças de gado bovino, estava a ter bastante lucro.

Crystal reforçou todas as fechaduras do estábulo para que não se repetisse o desaparecimento.
Nessa noite dormiu no estábulo, improvisou uma cama de feno e ficou ali.
No meses seguintes dedicou-se á escola, estava a ficar farta de tanta matéria, não percebia para que servia saber tanto de tanta coisa se não voltaria a usar aqueles conhecimentos na vida, tinha mais lógica se aprendesse mais sobre a vida na quinta, era essa a vida que conhecia, era essa a vida tencionava seguir, mas o futuro era incerto e nada é garantido.
A mãe ficou doente, estava a arder em febre e divagava durante horas, não queria estar deitada, queria trabalhar, mas o médico dizia o contrário.
Cabia agora a Crystal fazer o trabalho da mãe e garantir que ela não se levantava da cama, resumindo fazia o trabalho de 3 pessoas, o seu, o da mãe e o de enfermeira, andava muito cansada, trabalhava 16 horas por dia, e só á hora que o pai chegava a casa podia finalmente descansar, passava para ele a tarefa de cuidar de Sally, o resto tinha sido tratado, por Crystal, durante o dia.
Já se encontrava naquela situação á algumas semanas, e a mãe parecia não melhorar, a visita do médico era constante naquela casa, parecia que já fazia parte da família, não era a primeira vez que ali almoçava ou jantava.
Jack, por muito que lhe custasse, estava a habituar-se á ideia que Sally poderia não melhorar, ou poderia mesmo morrer, ele afastara-se dela nos últimos tempos, continuava a amar a mulher, nunca deixaria, continuava a tratar dela da mesma maneira, mas no seu intimo, estava a afastar-se.
Não conseguia imaginar a sua vida sem ela, estavam casados á 25 anos e estavam juntos á quase 30, era muito difícil imaginar o que lhe aconteceria a ele se ela desaparecesse, mas a verdade é que tinha de encarar já essa ideia, para depois puder dar apoio á filha.
O estado de saúde de Sally agravara-se, e o médico não tinha explicação para o que lhe estava a acontecer, já não se levantava da cama, estava agora completamente paralisada, mal falava, estava em estado lastimável.
A dia 2 de Abril de 1938, Sally faleceu aos 47 anos, vitima de uma doença até então desconhecida.
Deixou para trás uma vida sofrida, uma vida de muito trabalho, era mulher e mãe, e uma excelente dona de casa.
O funeral foi realizado na sua quinta, Crystal escolheu o sitio onde iram enterrar a mãe, um local próximo do seu tão adorado lago, assim, sempre que visitasse o lago veria a mãe e a mãe iria vê-la também.
A reacção de Crystal ao acontecimento não foi a esperada, chorou, obviamente, mas não tanto quanto se esperava, pelos vistos Crystal já estava á espera que isto acontecesse, a mãe estava mal á uns meses e não mostrava sinais de melhorar.
Juntaram a família mais próxima e alguns amigos de quintas ali perto, foi uma cerimónia simples, tal como Sally era.
Crystal assistiu á cerimónia serenamente, trazia um vestido negro, simples mas muito bonito, ficara junto do pai, não chorou. Quando os últimos centímetros de terra foram lançados, Crystal afastou-se, subiu a um monte ali perto e sentou-se, num ponto alto onde via quase toda a propriedade, mas mais importante que isso, via a mãe sem que quem lá estava junto a visse a ela.
Sentia-se em paz naquele momento, sentia uma espécie de alivio, a mãe tinha deixado de sofrer, e onde quer que estivesse estaria melhor do que deitada na cama sem se mexer.
Os meses seguintes foram de habituação, Crystal tomara o lugar da mãe após a sua partida, cabia a ela fazer tudo o que a mãe fazia.
O ambiente naquela casa era estranho, a ligação que tinha com o pai tinha-se degradado com o tempo, só falavam á hora de jantar e a conversa era banal, sem sentido.
Crystal era agora uma menina ainda mais solitária que antes, não ia á escola, perdera agora todo o interesse na educação, a única que a levava a ir lá era a mãe, e agora que não estava presente, já não fazia sentido insistir. As horas passadas na cozinha eram de angústia, tinha a sensação que estava a substituir a mãe, e até achava que o pai a via dessa maneira também.
Os dias eram agora monótonos, Crystal deixara de viver para adquirir um estatuto de maquina, fazia tudo o que devia e ás vezes mais, sem nunca se queixar, havia dias em que não falava com ninguém, sentia-se perdida.
Todos os dias levava um ramo de flores á campa da mãe, mantinha-a livre de ervas, fizera uma clareira ali, plantara algumas rosas ali perto, uma espécie de santuário.
Rezava todos os dias para que onde quer a que a mãe estivesse os ajudasse a sobreviver mais um dia.
O tempo com Stalion tornara-se curto, quase inexistente, só o via quando lhe levava feno e água, ele não saia do estábulo, não davam os passeios matinais como antigamente, e ele dava conta disso, sempre que ela entrava na sua box, ele aproximava-se e dava um toque com o focinho nas suas costas, como que a dar-lhe apoio, a dizer que a compreendia.
Crystal pedia-lhe desculpas, sempre que saia do estábulo, sentia-se culpada por ele não sair dali, mas a verdade é que não tinha tempo para o vir por ao estábulo á noite e não o queria deixar á solta.
Só Stalion se mantinha na quinta, todos os cavalos que Crystal ficara a tomar conta tinham sido vendidos, não havia razão para os manter ali fechados, e por muito que lhe custasse, provavelmente Stalion teria o mesmo destino, mas não por agora.
Queria mantê-lo o mais possível junto de si, apesar de já não lhe dar tanta atenção, continuava a adora-lo, era o seu cavalo.
Finalmente a 20 de Agosto de 1939 Crystal conseguiu tirá-lo do estábulo, chegara ao seu limite e não conseguia continuar a vida monótona que tinha, deixou tudo o que tava a fazer e foi dar um longo passeio pelas redondezas, era a primeira vez que saia da quinta sem ser para ir á escola ou a alguma feira com os pais.
Sentia-se confiante para dar uma volta e explorar os montes que circundavam a quinta.
O pai, quando chegara a casa, apercebera-se que ela não tinha feito o que devia, mas não podia culpar a pobre rapariga, afinal ela só tinha 14 anos e á muitos que trabalhava e era tratada como uma adulta, também tinha o direito de sair e fugir um pouco ás responsabilidades.
No final do dia Crystal regressou a casa, o pai já la estava, sentado á mesa e a primeira coisa que se lembrou foi pedir desculpas.
"Desculpa pai, não queria deixar tudo por fazer."
"Não peças desculpas, devia sair, divertir-te, não devias estar sempre aqui fechada a trabalhar."
"Mas... agora que..."-Ainda lhe custava falar no assunto
"Não precisas de o dizer se não quiseres."- o pai sabia a que ela se referia.
"Não, eu consigo." respirou fundo e tentou de novo "Agora que a mãe não está entre nós, tenho que trabalhar como deve ser, sozinho não consegues resolver tudo."
"Sim, tens razão, mas precisas sair, arranja um tempo para ti, precisas de apanhar ar"
"Ok, vo tentar arranjar um tempinho para apanhar ar."
"Fazes bem, agora vai descansar, até amanha."

A 1 de Setembro de 1939, a noticia irrompeu o pais como uma bomba, a Polónia acabara de ser invadida pela Alemanha Nazi, estava eminente uma guerra mundial, Jack, como fuzileiro retirado temeu que fosse chamado se os EUA entrassem em guerra, o que seria de Crystal, o que seria da quinta que tanto trabalho dera a ser criada.
A França, o Império Britânico e o Commonwealth (associação de territórios autónomos, mas dependentes do Reino Unido, criada em 1931 e formada actualmente por 54 nações, a maioria das quais independentes, mas incluindo algumas que ainda mantêm laços políticos com a antiga potência colonial britânica) rápido declararam guerra aberta á Alemanha. E os países que já nessa altura estavam em guerra, Etiópia e Itália na Segunda Guerra Italo-Etíope e a China e Japão na Segunda Guerra Sino-Japonesa só serviram para aumentar o caos no mundo. Todos os países que ao principio se mantiveram afastados, acabaram por se envolver aquando da invasão da União Soviética pelos Alemães e os ataques Japoneses contra as forças dos Estados Unidos no Pacífico em Pearl Harbor e em colónias ultra marítimas britânicas, que resultou em declarações de guerra contra o Japão pelos EUA, Países Baixos e o Commonwealth Britânico.
Tudo o que Jack temera aconteceu, recebeu uma visita de uma coluna militar que obrigava todos os homens que tinham entre 18 e os 50 anos a alistar-se no exército, e ele como ex fuzileiro foi dos primeiros a ir, tinha a experiência e o conhecimento militar que o exército precisava.
O mundo de Crystal desabou, primeiro perdera a mãe, agora arriscava-se a perder o pai, o tio e os primos numa guerra que não era a sua, mas sim de um país.
Jack foi levado nesse mesmo dia, não teve direito a orientar as coisas para a filha, foi só com o que tinha vestido, e ao entrar no tanque gritou para Crystal
"Amo-te muito filha, nunca te esqueças disso, amo-te muito, trata de ti, eu prometo que volto, prometo!" -as lágrimas não foram poupadas por ambas as partes, Crystal sabia que o pai tencionava cumprir o que dissera mas também sabia que era pouco provável ele conseguir regressar a casa são e salvo, mas não desistiria, rezaria por ele todos os dias.
Os aviões passavam nos céus todos os dias, carregavam um ambiente pesado e destrutivo, e sempre que Crystal os via arrepiava-se, mas não deixava de vir á rua, na esperança que isso servisse para que o pai não se magoasse, a dor de perder a mãe fora imensa, e perder agora o pai iria ser insuportável.
Crystal tentou manter a quinta tal como era, tratava do gado do tio, tratava dos campos do pai, e fazia as tarefas que a mãe fizera outrora.
Mal descansava, trabalhava imenso, havia noites em que só dormia 2 horas, sentada na sala, não tinha tempo nem vontade de subir ao 1º andar e deitar-se na cama.
Crystal aguentou aquele ritmo durante 2 meses, mas já não dava para mais, vendeu todo o gado dos tios, a tia também não conseguia aguentar.
Os campos mantinham-se operacionais, decidiram vender a outra metade habitada da quinta, onde viveram os tios, a tia e a prima viriam para sua casa, assim, juntos conseguiriam sobreviver melhor.
A quinta resumia-se agora a uma casa habitável, um estábulo, a estufa e o lago, era sensivelmente metade do que fora quando os homens da família lá estavam.
Com a união das mulheres da família, todas as tarefas foram facilitadas, mas não deixava de ser difícil.
Não tinham novidades dos homens á alguns meses, os aviões continuavam a passar por ali.
No dia 10 de Fevereiro 1940 ouviu-se um estrondo enorme ali perto, acabara de cair um avião Americano a alguns metros da casa.
Crystal foi buscar a carrinha, aprendera a conduzir, tinha de se movimentar na quinta.
Foi ver o que se tinha passado, ao chegar ao local, apercebeu-se que o avião tinha caído em cima de um estábulo abandonado, mas apesar do choque o avião não se incendiara, os destroços estavam espalhados por todo o lado.
Ao longe Crystal ouviu um gemido, foi a correr ver o que se passava.
Ao chegar ao local onde tinha ouvido o gemido, viu um marine americano, preso no cockpit do avião.
"Ei, tás bem?"
"Ai"-Gemeu-"Sim, acho que sim, ajuda-me, tira-me daqui por favor."
"Claro que sim, espera."- Crystal rastejou pelos destroços e chegou finalmente ao marine.
Este estava coberto de sangue, a perna estava presa na fuselagem, Crystal, com todas as forças que tinha conseguiu mover o bocado de ferro que o prendia, e libertou-o.
Levou-o a custo para a carrinha, sentou-o no banco do passageiro, rasgou a sua camisa e fez um torniquete para estancar a hemorragia que ele tinha na perna.
"Obrigado, muito obrigado por teres ajudado."
"Não agradeças, vou-te levar para minha casa e tratar de ti."
"Muito obrigado. salvaste-me a vida."
Crystal levou-o até sua casa, quando la chegou a tia ficara chocada, ajudou-a a tirá-lo da carrinha e deitou-o no sofá, aqueceu água e passou um pano nas feridas.
Trataram das feridas, a tia teve que lhe coser a perna a sangue frio, a dor era imensa mas teve que ser, só assim iriam conseguir estancar o sangue.
"Muito obrigado, vou ficar-vos eternamente agradecido, minhas senhoras.
"Não agradeça, ponha-se bom." -Disse Dolores, a tia de Crystal, afastando-se.
"Posso tratar-lo por tu?"- perguntou Crystal.
"Sim claro, é o mínimo que posso fazer depois de me teres salvo a vida."
"Como te sentes?"
"Muito melhor agora, graças a ti"
"Ainda bem, posso saber o teu nome?"
"Desculpa a indelicadeza, sou o Sargento Paul Walker, faço parte da unidade aérea."
"Vinhas para aqui ou ias para a guerra quando o avião caiu?"
"Ia para lá, cheguei á 2 dias atrás para reagrupar e voltava para lá."
"O que aconteceu ao teu avião? Foram atingidos?"
"Não, ou fomos sabotados ou o avião já não estava em condições."
"Vinha mais alguém contigo? Não vi lá mais ninguém"
"Não, estava sozinho, ia apanhar o resto da unidade a caminho para a Alemanha."
"Ok, desculpa as perguntas mas estou curiosa."
"Podes perguntar o que quiseres á vontade."
"Que idade tens?"
"Tenho 37 anos, estou á 20 no exército, não queria estudar e o meu pai mandou-me para o exército, mal ele sabia que o mundo ia entrar de novo em guerra mas pronto."
"Mas depois de atingires a maioridade podes sair do exercito certo?"
"Sim, mas o que vinha fazer cá para fora? Não tenho estudos, não se arranja trabalho assim, e no exército tenho trabalho garantido, o meu pai recebe o meu salário, lá não preciso dele e ele faz-lhe falta."
"E onde está o teu pai?"
"Agora está preso. Desertor."
"Desculpa, não sabia. Desertor? O que é isso?"
"Uma pessoa é desertora quando não quer servir o exército, quando foge ao seu dever militar quando é chamado para o cumprir"
" Pois, o meu pai e o meu tio tiveram de ir, deixaram-nos aqui sozinhas."
"Lamento, mas o exército é a unidade mais importante do país, e como tal todos temos de servir os interesses do país."
"Mas isto é uma guerra do país, não é do meu pai, porque é que ele, não tendo nada a ver com isto teve que ir."-Crystal era ingénua, não percebia o porquê de algumas escolhas do país.
"Ainda és muito nova para perceber as decisões políticas. Ainda estás na idade para ir á escola certo?"
"Sim, tenho 15 anos mas desisti."
"Desististe? Porquê?"
"Porque não gostava da escola, e surgiram alguns problemas e não dava."
"Queres falar nesses problemas?"
"A minha mãe morreu uns meses depois de ter ficado doente."
"Lamento, não precisas falar nisso se não quiseres."
"Não, não tem problema, foi melhor assim, já sofria á demasiado tempo."
"Pois, e como te estás a safar?"
"Vou indo, tenho de continuar a minha vida."
"Fazes bem, a tua mãe iria ficar contente."
"Espero que sim."
A noite caíra e não deram por isso, quando se aperceberam já estava na hora do jantar.
"Jantas connosco?"
"Não, não quero estar a incomodar."
"Não incomodas, é bom variarmos um bocadinho a companhia."
"De certeza que não incomodo?"
"Não, eu preparo algumas coisa para nós, tens preferência?"
"Não, o que fizeres de certeza estará á minha altura, de certeza que será melhor do que o que dão no exército"
"Talvez, terás que esperar para ver"
Crystal preparou massa á bolonhesa, Paul comeu como se já não comesse á meses.
"Está bom suponho"- Brincou Crystal.
"Está divinal, muito obrigado."
"Ainda bem que gostas, come á vontade. Tens sitio onde passar a noite?"
"Agora que falas nisso, não, nunca mais me lembrei disso.Mas eu arranjo um quarto num hotel qualquer."
"Não, não é preciso, podes ficar aqui, temos espaço para ti."
"Não, não quero incomodar mais do que já incomodei. Já fizeram muito por mim."
"Não sejas parvo. Ah...desculpa."- Crystal ficou embaraçada, levou as mãos á cara.
"Não faz mal, não te preocupes"- Respondeu Paul rindo-se
"Desculpa a sério. Não sei porque é que disse aquilo."
"Não te preocupes, não tem mal nenhum. De certeza que não há problema se ficar aqui por esta noite?"
"Não, podes ficar o tempo que precisares, estás á vontade."
"Só vou ficar esta noite, mas obrigado pela hospitalidade."
"Não tens que agradecer, é bom ter-te aqui."
Trocaram olhares carinhosos, mas Paul obrigou-se a parar, ela era ainda uma criança, afastou o olhar, apesar de Crystal continuar a olhar para ele. Ela não via mal nenhum nisso.
"Crystal, gostava de descansar um pouquinho."-Disse Paul mais para aliviar o ambiente do que por necessidade.
"Certo. Anda."-Crystal levou-o ao quarto de hóspedes. Dolores tinha feito a cama minutos antes de se ir deitar.
"Que achas, serve?"
"Se serve? Estás a brincar certo, tá excelente, eu dormiria bem nem que fosse no chão"
Riram-se, despediram-se, Crystal deu-lhe um beijo no rosto e saiu sem nada dizer.
Paul ficara a noite toda a pensar naquele beijo, tão inocente, mas ao mesmo tempo sentiu algo especial.
De manhã, desceu á cozinha e reparou em Dolores. "Posso tomar um banho? Pensei fazê-lo ontem mas não quero abusar da vossa hospitalidade."
"Ora essa homem, esteja á vontade, faça como se estivesse em sua casa"
"Muito obrigado, a sério, já venho então."
"Ok, até já"
Paul tomou banho, e ao dirigir-se ao quarto deu de caras com Crystal, esta lançara-lhe um olhar breve e curioso e descera as escadas.
"Que estúpido, bolas..."-Pensou ja no quarto, enquanto se vestia.Crystal vira-o só com a toalha.
Desceu, encarou Crystal e pediu-lhe desculpas pelas figuras que tinha feito.
"Não tem problema, tavas a sair do banho, é normal. Por falar nisso, não queres outra roupa, essa ta toda suja e rasgada."
"Não, a sério, não posso andar aí sem a farda, ainda pensavam que estava a fugir do dever."
"Á pois, é verdade, ok, sendo assim, senta-te come alguma coisa, temos panquecas e sumo de laranja, gostas?"
"Adoro.Vo comer qualquer coisa, vou ajudá-las no que precisarem e depois vo fazer-me á estrada."
"Não precisa ajudar em nada, já faz muito pelo pais."-Dolores interveio na conversa, antes de sair, ela não se envolvia muito em conversas, dizia somente o essencial.
"Mas eu quero ajudar, se não se importarem, têm trabalho pesado aqui na quinta de certeza, posso ajudar."
"Não, a sério, podes ir, nós desenrascamo-nos, temos feito tudo sozinhas, infelizmente."
"Ficava melhor comigo mesmo se fizesse algo para retribuir a vossa generosidade."
"Pronto, está bem, come descansado, vo pensar em algo para fazeres."

Paul ajudou a amontoar o feno que tinha sido junto no dia anterior, amontoaram-no no estábulo, demorou 3 horas a amontoar os 2000 fardos de feno, quando terminou, foi tomar banho e foi-se embora, estava na altura.
"Adeus, D.Dolores, muito obrigado por tudo o que fez por mim, o que posso fazer para agradecer?"
"Traga os homens desta familia de volta, são e salvos."
"Vo fazer os possiveis para os descobrir, prometo."
"Ok, espero que estejam bem."
"Estarão com certeza."
Depois, dirigiu-se a Crystal
"Adeus,Crystal. Gostei de te conhecer, muito obrigado por me teres tirado daquele maldito avião."
"Tambem gostei de ter conhecer, foi bom puder ajudar um veterano de guerra, por favor sobrevive, aparece sempre que quiseres."
"Assim que acabar a guerra volto para ver como vocês estão, prometo."
"Espero que cumpras a promessa."
"Vo cumprir, não te preocupes.Eu volto."
Despediram-se com um beijo no rosto, desta vez Paul tinha a certeza dos seus sentimentos por ela, e os dela por ele, mas até ela ter 18 anos, nada podia fazer.

Meteu-se a caminho, ia caminhar por uns quilometros e tentar arranjar uma boleia.
Olhou para trás ao fim de alguns minutos a caminhar e apercebeu-se que Crystal ainda ali estava, á saída da quinta a olhar na sua direcção.
Olhou mais atentamente para ela e reparou que havia algo diferente na sua expressão.
Eram lágrimas que corriam naquele belo rosto.
Paul tentou resistir ao desejo de lá ir abraçá-la, mas não conseguiu, correu na sua direcção.
Deteve-se a poucos centimetros dela, não sabia o que fazer, na sua cabeça só pensava em abraçá-la...em beijá-la...mas não se podiam envolver, Crystal não se mexeu, ficou ali, fixa nos olhos dele, a sua tenra idade fez-se notar.
Paul limpou-lhe as lágrimas e deu-lhe um beijo na testa.
"Não chores, eu volto, já prometi que volto.
"Espero bem que sim, vou ficar á tua espera, sabes onde me encontrar."
"Sim, eu volto quando isto tudo acabar, não te preocupes."
"Como não me preocupo, estás na guerra, pessoas matam e morrem á tua volta."
"Eu sei cuidar de mim, eu vou conseguir ver-te uma vez mais, prometo."
"Eu sei que sabes cuidar de ti, os outros é que me preocupam."
"Olha-me nos olhos"-Disse-lhe, elevando gentilmente a cara dela-"Eu volto."
"Ok."-Nada mais disse.
Estava na altura de Paul ir, desta vez abraçaram-se.
Depois de um longo e apertado abraço Paul virou-se e afastou-se, não conseguia aguentar mais, tinha de sair dalí.
Desta vez era no rosto de Paul que as lágrimas corriam, ele nunca pensara que isto lhe acontecesse, apaixonar-se numa altura daquelas, muito menos por uma jovem menina.
Obrigou-se a seguir em frente, sem olhar para trás, sabia que ela ainda ali estaria no mesm sitio onde a deixara depois do abraço. Era dificil sair daquele local, ela parecia precisar de atenção, de carinho, de amor, mas ele não lhe podia dar tudo isto, não que não o quisesse dar, mas ela era tão nova.

Crystal ficou ali durante uma hora, na esperança que Paul regressasse, desta vez para ficar.
Mas tal não aconteceu, Paul tinha ido, e secalhar para sempre, ela ficaria á sua espera.
Por fim desistiu, saíu daquele local e foi direita ao estábulo, montou Stalion e foi á procura de Paul, percorreu alguns quilometros mas não o vira, ele devia ter conseguido apanhar boleia.
Regressou á quinta, pôs comer e água a Stalion, foi para casa mas não parou na cozinha para ver se a tia precisava de ajuda, foi directa ao quarto onde Paul tinha dormido, esperava que este ainda tivesse o seu cheiro, mas para sua grande tristeza, a tia já tinha metido a roupa para lavar e já tinha feito a cama de lavado, a sua tentativa tinha sido em vão.
Foi então para o quarto, chorar.

Os dias seguintes foram difíceis, sentia agora a falta do pai, do tio e de Paul.Um mero desconhecido que tinha entrado na sua vida de rompante, só o conhecera por ele pertencer ao exército, algo que ela detestava, a guerra, se os EUA não tivessem entrado em guerra poderia nunca chegar a conhecer aquele homem.
Ainda assim não percebia o porquê da guerra, qual o objectivo de tantas mortes, tantas vidas perdidas quando nada tinham a ver com tudo aquilo. Na sua maneira de pensar nada daquilo tinha lógica, mas nada podia fazer, a guerra existia e estava acontecer não muito longe dali.
Atá agora tinham conseguido manter-se alheias á guerra, não havia colunas militares por ali, os ataques aéreos não tinham atingido aquela zona, no meio de tanta destruição tinham tido sorte.
Pensava em Paul todos os dias e a toda a hora, imaginando o que ele estaria a passar, onde estaria, se teria conhecido o seu pai, se ambos estavam bem, se estariam em perigo, se estariam a salvo, se estaria sequer vivos, eram muitas as ideias que lhe passavam pela cabeça, mas ela imaginava o dia em que tudo acabava e os via, aos três, o tio tambem importava, a entrarem na quinta bem de saúde, a falarem alegremente.
Seria o cenário ideal, primeiro por estarem todos vivos, e depois era sinal que todos eles cumpriam com as suas palavras, o tio tinha prometido á mulher que voltaria, o pai tinha-lhe prometido voltar para a quinta, e Paul tinha prometido que voltaria a vê-la outra vez, essas eram as promessas que lhe davam força para se levantar de manha cedo e ir trabalhar, quando pensava neles conseguia fazer tudo sem esforço, quando dava conta estava deitada na cama, e mais um dia tinha passado.
Á noite, sonhava com o dia em que tinha salvo aquele marine, um homem forte, cabelo louro, olhos azuis, bronzeado, muito sulista, tinha até ar de surfista, e se não soubesse que ele pertencia ao exército diria até que ele era surfista profisional, tinha ar disso.
Um homem tão forte mas no entanto tão frágil, estava ferido quando o encontrou, e mesmo depois de ter tratado dele, este não se mostrava tão severo como os homens que conhecera, era gentil, calmo na maneira de falar, sensivel, não levara a mal aquele deslize, era, a seu ver, perfeito.
"Em que estás a pensar Crystal?"-Perguntou a tia um dia enquanto tomavam o pequenoa almoço, Crystal estava pensativa á uns dias, mas estava agora com uma expressão mais séria que o costume
"Ah? Nada, estava a pensar no que tenho que fazer hoje."
"Como assim, tens que fazer o mesmo que ontem, o mesmo que nos dias anteriores."
"Sim, ta bem, mas tu sabes."
"Não, não sei, por isso te perguntei."
"Nada, estava a pensar na vida."
"Estavas a pensar no Sargento Walker é o que é."
"O quê? O que estás a dizer?"
"Sim, eu reparei nos olhares que lhe lançavas, e eles a ti. Sabes que daí nao vai sair nada nao sabes, ele é demasiado velho para ti, e tu ainda és uma criança."
"Se sou uma criança o que faço a trabalhar como um adulto?"-Crystal estava irritada por a tia se ter metido no assunto e por falar assim, como se tudo fosse impossivel.-"E ele não é demasiado velho, e se for não quero saber, gosto dele como é, e a idade não devia ser um impedimento quando se ama alguém."- Crystal falava como uma mulher e não como a criança que era
"Ouve, tu és muito nova para essas coisas, para além do mais, ele pode não voltar, tu sabes disso"
"Pára! Retira o que disseste já!"-Estava agora aos gritos, aquilo era o pior que alguém podia dizer numa situação daquelas.
"Baixa o tom de voz Crystal."
"Não baixo, não mandas em mim, e não te esqueças que estás em minha casa."
"Mau, não estou a gostar do teu tom de voz minha menina. Comporta-te como a mulher que dizes ser."

Crystal estava farta da conversa, saíu antes que dissesse mais alguma coisa que não queria.
Esteve dias fora de casa, a tia andava á sua procura, pusera os vizinhos á sua procura também, Stalion tinha desaparecido do estábulo também, e para levar o cavalo, tinha ido para longe.
Crystal tinha-se refugiado numa velha quinta ali perto, num velho estábulo abandonado.
Tinha levado alguns cobertores para cavalos, e usava-os para se abrigar do frio, o estábulo estava em mau estado, tinha buracos enormes nas paredes, o que deixava passar os friso ventos que se faziam sentir naquela altura do ano, mas o tecto estava em bom estado, o que significava protecção em caso de tempestade.
Durante o dia aproveitava a ausência da tia em casa para ir buscar alguns mantimentos e a sua roupa, arranjou até maneira de levar alguns fardos de feno para o Stalion.
Assim que chegou ao velho estábulo pôs-lhe água e deu-lhe comer, em seguida dirigiu-se ao barracão antigo encostado ao estábulo, abriu-o e reparou em várias ferramentas agrícolas, tal como sacos de adubo e algumas sementes.
Pensou em trabalhar a terra, não lhe daria comida a curto prazo mas a longo prazo ajudava nos mantimentos e foi isso que fez, plantou um bocadinho de cada, tinha ali macieiras, pessegueiros, videiras, alface, tomates, pepinos, basicamente o soficiente para se desenrascar por uns tempos, o resto tentaria arranjar.
Passou uma semana desde o seu desaparecimento, de quando em vez ainda ouvia alguém chamar o seu nome. Não tencionava voltar, ia lá durante o dia, quando não havia o risco de se encontrar com ninguém, já que estavam todos a trabalhar, para garantir que a tia continuava o trabalho, não queria que quando o pai chegasse não visse a quinta a produzir.

No dia 30 de Maio, quase 4 meses depois do desaparecimento e ninguém sabia de Crystal, ela estava agora magra, em más condições, continuava a ir á quinta buscar alimento mas não trazia muito, para não dar nas vistas, sempre que podia ia ao mercado comprar carne e peixe com o dinheiro que conseguira trazer das suas poupanças, não era muito, mas com algum planeamento dava para se alimentar como deve ser por algum tempo.
Nesse dia á noite, Crystal dormia quando ouviu as portas do estábulo abrirem-se, pensou logo que a tinham descoberto, mas não conhecia quem tinha visto entrar. Era um homem já velho, gordo, roupas rasgadas e cambaleava, ou estava ferido ou bêbedo, não se mexeu, preferiu ficar ali sossegada, podia ser que ele saísse dali sem a incomodar, afinal não sabia que ela ali estava.
Pensou ela.
O homem tinha-a visto, da sua quinta, a entrar no estábulo algumas horas antes.
"Ei, ei menina onde estás?"- Gritou
"Ele sabe que eu estou aqui, como?" Comentou em voz baixa.
“Ó menina, anda cá, eu sei que estás aqui.”
“Ai, o que é que eu faço.”- Crystal estava apavorada, o que estava ele ali a fazer e o que tencionava fazer com ela caso a encontrasse. Pegou num bocado de ferro que estava ali perto, para o caso de ele a tentar magoar.
“Anda cá, onde estás menina.”

Crystal viu-se metida num sarilho, ele conseguiu descobri-la.
Arrastou-a até a um monte de palha, agrediu-a, bateu-lhe violentamente, Crystal quase desmaiara.
"Pára, porque tas a fazer isto, pára."-Gritava Crystal mas em vão, o homem estava claramente embriagado, ela não percebia o porque de ele estar a fazer aquilo.
Por fim ele parou. Afastou-se por uns momentos, Crystal pensava que tinha acabado, mas não, ele não tencionava acabar.
Regressou e deu-lhe um pontapé no estômago, Crystal vomitou.
Perdeu os sentidos nas pancadas seguintes.
Quando recuperou os sentidos, estava completamente partida, não sentia o corpo, mal se mexia, custava a respirar, tinha voltado a partir as costelas, disso tinha a certeza.
Manteve-se naquele sitio por mais dois dias, ninguém que ela ali estava,ninguem sabia que ela estava ferida, não havia ajuda possível.
Stalion fugiu e não deu sinais durante umas horas, e quando apareceu não vinha sozinho, uma senhora acompanhava-o, esta quando a viu entrou em choque, mas agiu.
"Como te chamas?"
"Crystal."-Disse a custo
"Que idade tens Crystal?"-Pareciam perguntas fúteis para um momento daqueles, mas eram importantes, primeiro para que os médicos saberem quem tratam quando la chegarem, depois para ver se Crystal se lembrava de quem era, e lembrava-se, era sinal que não tinha traumatismo na cabeça.
"Tenho quase 16 anos"
"Ok, vou-te ajudar, vo levar ao hospital, aguenta tá bem."
"Vou tentar, muito obrigado"
"Agradece ao teu cavalo, ele foi-me buscar quase dentro de casa, é muito inteligente o bicho."
"Pois é"-Sorriu ao passar por Stalion, apesar do seu estado.

Crystal tinha as roupas todas rasgadas, estava praticamente nua, estava toda negra, tinha sido muito maltratada.
Já no hospital, Crystal soube que as costelas que tinham sido reparadas tinham sido de novo partidas, tinha partido os braços em vários sítios ao tentar proteger-se do agressor.
Tinha feito queixa á policia, estavam á procura do homem que lhe tinha feito aquilo, e pela descrição eles estavam bem lançados na sua busca, tinham a sensação que sabiam exactamente de quem se tratava.
A tua foi avisada que ela ali estava, era a sua única família naquele momento.
"Finalmente tenho noticias tuas, infelizmente foi no pior caso possível, como estás."
"Estou bem, acho."
"Descansa, vou falar com o médico, já te venho ver outra vez."
Sally foi informada que Crystal tinha partido as costelas, os braços, e tinha sido violada, estava em muito más condições.
Sally ficou em choque, e perguntou se já sabiam quem tinha feito aquilo, o medico informou-a que a policia estava a tratar disso.
Crystal teve alta algumas semanas depois.
Regressou a casa, onde de nunca devia ter saído.
Decorria o ano de 1945.

Crystal voltára a casa 2 anos antes, depois da sua fuga, pelas piores razões mas tinha regressado.
Ela tinha agora 20 anos, geria a quinta da família, que se reduzia agora á habitação e a um celeiro vazio, só cheio com feno, na sua altura, o resto do ano nada havia ali.
Dedicavam-se agora á venda de feno ás quintas vizinhas.
Para grande trizteza de Crystal, tinha-se visto obrigada a vender a quinta aos poucos, não conseguira cumprir o que prometera ao seu pai, e o pior de tudo era que o seu pedaço de terra preferido, onde ficava o seu adorado lago, era a próxima porção de terra a vender.

A 2 setembro de 1945, o Japão assinava formalmente diante dos representantes das nações aliadas no oriente a rendição a bordo do USS Missouri, na baía de Tóquio, pondo então fim á Segunda Guerra Mundial.
Não tinham noticia dos homens da familia havia 5 anos, nem deles nem de Paul Walker, nenhum deles havia aparecido.
Numa manhã, Crystal levantou-se com um pressentimento que algo iria acontecer naquele dia, não sabia o que era, mas sabia que algo aconteceria.
Tomou o pequeno almoço e foi dar um passeio, recordar os bons velhos tempos.
Os dias em que a mãe ainda ali estava, os dias em que os pais e o tio percorriam aquela terra, então fértil e produtiva.
O dia em que conhecera o Sargento Paul Walker, o homem que lhe mudou a vida, para sempre.
Mas agora, 5 anos depois de o ter conhecido, estava ali sem ninguém, sozinha, envolta nos seus pensamentos.
Dirigiu-se uma última vez ao lago, este seria vendido no dia seguinte, para sua grande tristeza.
Estava uma manhã fria, o nevoeiro estava serrado, só se viam uns metros á frente, nada mais.
Finalmente chegou ao lago, estava demasiado frio para nadar, decidiu então ficar sentada numa rocha ali perto. Chorou durante a sua estadia naquele local.
A sua vida tinha-se desfeito de um momento para o outro com a morte da mãe, e até então nada melhorara, perdera tudo o que amava, a quinta que conhecia, aqueles montes, aquele terreno outrora cheio de gente trabalhadora, cheio de plantas, cheio de vida.
Tudo isso desaparecera da sua vida, continuava verdejante e produtivo, mas já não lhe pertencia, pertencia agora a propriedades vizinhas, a gente que ela não conhecia, alguém que lhe tinha tirado o que ela gostava, a sua vida.

Esteve naquele local, imobilizada pelo medo, pelas lembranças, durante mais de 3 horas.
Decidiu que estava na altura de sair dali, ja chegava de sofrimento.
Mas ao fazê-lo algo maravilhoso aconteceu.
No meio da nebulina apareceu um vulto, Crystal estava ainda afectada pelo momento, e foi incapaz de se mexer.
O vulto parecia abatido, procurava por algo que ainda nao tinha encontrado, mas assim que a viu tudo mudou, parou por um momento, como que a se certeficar se era ela que ali estava.
Deu mais uns passos nas sua direcção, ficando parado em frente a Crystal.
Já não estava em volto em nevoeiro, era agora visivel quem ali estava.

Era Jack, tinha sobrevivido á 2ª guerra mundial, estava ali, tal como prometido.
“Olá.” –Disse Jack, cansado mas com um sorriso enorme nos lábios.
“Olá, pai.”- Crystal levantou-se e correu para ele.
Ficaram abraçados o que parecia uma eternidade.
”Senta, vamos falar.”-Jack estava obviamente cansado
“Fico tão feliz por te ver, começava a perder as esperanças.”
“Eu sei querida, mas voltei, prometi-to e cumpri.”
“Ainda bem, nem sabes a satizfação que tenho de te ter aqui.”
“Eu também adoro estar de volta. Como estão as coisas por aqui?”
“Bem, a quinta está mal, infelizmente, não conseguimos manter a quinta como estava, tivemos que vender quase tudo, só falta a casa, o celeiro, e este sitio onde estamos, e até isto vai ser vendido, vem cá amanhã alguém para comprar.”
“Bem, não faz mal, havemos de resolver isto, foste sobrevivendo é o que interessa.”
“E o tio? Que se passou?”
“Ele infelizmente não resistiu.”
"Lamento"- Fizeram uns minutos de silêncio na em sua memória.
“Mas sabes uma coisa curiosa?”
“O quê?”
“O ano passado, estavamos numa trincheira sobre fogo inimigo, um homem desabafou comigo que tinha conhecido uma menina fabulosa para estes lados. Uma menina que apesar de muito jovem de idade era já uma adulta no pensamento.”
“Aí sim?”- Crystal tinha a sensação que o pai falava de Paul.
“Sim, achei estranho, não o conhecia, mas ele, por alguma razão decidiu confessar tudo aquilo comigo.”
“E o nome, soubeste o nome dele ao menos?”
“Sim.”
“Quem era?”
“Não me lembro, agora esqueci-me, deve ser da emoção de estar aqui ao teu lado.”
“Talvez, mas agora fiquei curiosa. Gostava de saber quem era.”
“Assim que me lembrar digo-te ok?”
“Ok”
“Agora vo tomar um banho, to mesmo a precisar.”
“Ok, até já pai, já vou para casa.”
“Até já querida.”
Crystal viu o pai afastar-se, embrenhar na neblina.

Passados alguns minutos um vulto voltou a ver-se ao longe. Desta vez parecia mais alto que o pai. Não deveria ser este de novo.
E não era de facto.

Finalmente, depois de tanto tempo separados, a promessa cumpriu-se,
Paul estava de regresso.
Tinha sobrevivido á guerra e o mais importante, pelo menos para Crystal, ele tinha-se lembrado dela.
Foi o primeiro sítio a que Paul se dirigiu, ao seu encontro.
Assim que o avistou a neblina pareceu levantar, via-o claramente.
Aqueles traços tipicos do Sul, Paul estava com bom aspecto, tendo em conta que tinha vindo do meio da guerra.
Já perto de Crystal, Paul não se conteve.
Abraçaram-se como nunca o tinham feito.
Paul estava agora legalmente correcto, ela era agora adulta, podia agora exteriorizar tudo o que por ela sentia.
Ao findar do abraço, Paul olhou-a nos olhos, de seguida procurou os lábios de Crystal, e encontrou-os sem obter resistência, entregaram-se ao desejo que ambos tinham guardado durante aquele tempo todo, demasiado tempo.
Aquele momento foi mágico, seria algo a relembrar anos mais tarde, sem dúvida.
Mantiveram-se assim, abraçados durante algum tempo.

Finalmente decidiram sentar-se. Paul sentou-se de maneira a que Crystal se pudesse aconchegar a ele, e de maneira a que ele a pudesse abraçar, sentir o toque suave da sua pele, o perfume dos seus cabelos.
Ficaram ali sentados, envoltos em silêncio, olhando apenas um para o outro e apreciando cada momento.
“Amo-te”- Começou Paul- “Finalmente posso dizê-lo sem receio.”
“Também te amo”- Voltaram a beijar-se
“Que tens feito na minha ausência?”
“Tenho tentado sobreviver, trabalhado mesmo muito.”
“ Tadinha.”
“Mas pronto, de certeza que o que passaste foi muito pior.”
“Sim, mas agora não interessa, o que interessa é que estou aqui ao teu lado.”
“És tão querido paul.”
“Só para quem merece.”
“ E eu mereço?”
“Eu acho que sim, mas não tenho a certeza”-Brincou.
“Acho que devias ter a certeza, mas ok.”
“Veremos.”
Namoraram, aconchegaram-se, acariciaram-se, compensaram todo o tempo perdido.
Por fim foram para casa, e quando entraram Sally chorava, era normal, tinha perdido o seu homem, o seu companheiro.
E o facto de não puderem fazer-lhe um funeral decente doía, o corpo não tinha viajado, não havia maneira de o fazerem.
“Acho que ainda assim ele merece uma cerimónia apropriada.”- Disse Paul.
“Eu também acho, apesar de não termos o corpo, a alma continua presente.”- Crystal estava de acordo.

E assim fizeram.
Realizaram uma cerimónia, que embora simbólica, significou muito para Sally e a restante família, iriam honrar um homem trabalhador, um combatente, um seguidor da pátria, um homem de respeito.
Paul com 42 anos e com a farda do exército, um fato negro onde tinha os emblemas de honra, parecia muito mais novo, estava muito elegante, o mesmo se passava com Jack, mantinha-se elegante e com bom aspecto.
Levantaram uma cruz ao lado da irmã, no lago, agora com Jack de volta, não era preciso venderem aquele pedaço de terra, era mais uma mão a ajudar no trabalho.
Foi uma merecida cerimónia, fizeram uma espécie de santuário, homenageando os seus feitos.
Os meses seguintes foram passados a trabalhar, todos participavam, queriam voltar a pôr a quinta na lista das melhores do estado.
Conseguiram comprar algumas cabeças de gado e recomeçar a criação.
Recomeçaram as plantações, a quinta estava a começar a ser utilizada para o que era suposto.

Crystal e Paul namoravam á 1 ano quando, no dia 30 de Julho de 1946 casaram na quinta de Crystal, junto ao lago.
Ergueram uma tenda onde tinham a comida e a bebida, Jack tinha construído um pequeno altar em madeira juntamente com Paul, entrelaçaram rosas brancas na madeira.
Paul casou com a farda do exército, esperava ser a última vez que tinha de a usar, só a usava em casamentos, e funerais. Casado já estava, e funerais, obviamente que não os queria ver.
O último funeral onde queria estar era no seu.

Crystal tinha um lindo vestido branco, rendado, sem alças.
A cerimónia foi simples, só tinham convidado os pais de ambos e os amigos de Paul, Crystal não os tinha, mas começou a ter naquele dia.
Casou com o homem da sua vida, Paul era tudo o que Crystal queria e precisava.
Depois do casamento foram morar para a cidade, ali tinham mais possibilidades que Crystal arranjasse emprego, ela cantava muito bem, e queria tentar.
Tiveram 2 filhos, o Paulie e a Joanna, ambos foram á escola assim que tiveram idade, Crystal não queria que eles fossem como ela, que tinha desistido de tudo para ajudar os pais, eles não precisavam.

Aos 18 anos Joanna fundou uma empresa em conjunto com uma amiga de infância.
Com a mesma idade Paulie seguiu as pisadas do pai, também ele entrou no exército.
Retirou-se em 1950, depois de ser honrado pelos serviços prestados ao país.
Viveram os 4 na mesma propriedade, tinham comprado um terreno onde tinham 3 casas, e assim podiam manter-se sempre juntos.


Apoio:

Quero agradecer a todos os que tornaram a realização desta historia possível.

Ao david, que apesar de nao ler tem desculpa ,ta doentinho tadinho do ursinho xD

Á menina Joana, que desta vez leu a história.

Á menina Diana por uma vez mais ter apoiado e incentivado.

E claro á minha baixinha, pelo apoio, incentivo e por não deixar que eu preguiçasse em vez de escrever.

Obrigado a todos.

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