...em sonhos...

Entrei por aquela porta como fazia todos os dias depois do trabalho.
Fechei-a atrás de mim com o típico som da madeira a bater. Pousei a mochila, agora vazia, que levava para o trabalho com o almoço.
Coloquei as chaves na mesa de apoio á entrada. Olhei-me ao espelho verificando se tinha tirado todo o óleo da minha pele. Estava limpa.
Olhei a minha volta e tudo estava como deixara de manha. As revistas na mesa em frente ao sofá. As janelas abertas, onde o sol á muito deixara de entrar e onde a luz da lua agora penetrava.
Apaguei as luzes que acendera ao entrar em casa. Não precisava delas. A escuridão e o silêncio davam-me o que precisava depois de um dia no trabalho. Sossego.
Descalcei-me e fui tirando a roupa consoante me encaminhava para o quarto.
Quando entrei, já em boxers avistei-te. O teu corpo repousava sobre a cama que partilhávamos, envolto nos lençóis ainda assim permitindo-me vislumbrar o que mais queria. Aproximei-me de ti sem fazer barulho. Tirei-te suavemente os óculos da cara e o livro das mãos. Adormeceras enquanto esperavas a minha chegada. Desculpa ter vindo tão tarde. Queria e precisava ouvir a tua voz. Mas jamais te iria acordar. Fiquei ali a observar-te, depois desloquei-me para a poltrona situada por baixo da janela. Mas não sem antes acariciar o relevo visível por baixo dos lençóis. No teu ventre. A tua barriga já se notava. A minha filha estava a crescer dentro de ti. O fruto do nosso sentimento, mais poderoso que tudo o que se conhecia. único, forte, intemporal, insubstituível.
Beijei-a com suavidade, depois repeti o gesto da tua face e fui então sentar-me.
A luz proveniente da lua entrava em 2 feixes, por uma brecha nas cortinas que iluminavam a tua face, e a tua barriga. Fiquei ali toda a noite a observar-te e só o cansaço me fez vacilar. Antes de encostar a cabeça proferi "è mais que amor" e acabei por adormecer ali. Sentado, guardando-te em sonhos. Sonhando com a nossa filha.